Eram tantos braços que ele costumava achar que tinha, que ele se percebia tocando em tudo. Eram tantos que quase sempre nem ele mesmo sabia distingui-los, dar-se conta deles. Os braços pareciam multiplicar-se, chegando ao ponto de que eram braços dos braços e nem tanto mais dele. Ele se sentia tão seguro, rodeado pelos “seus” braços e mãos nada chegava perto dele, antes disso ele já os havia manipulado com suas mãos ágeis e atentas. Tudo corria bem demais, quedas eram transformadas em cambalhotas, visto que suas mãos estavam sempre a postos, cumprimentava tantas pessoas ao mesmo tempo quanto quisesse. Foi na época em que percebeu estas habilidades que iniciou suas apresentações e performances. Eram demonstrações firmes de confiança e segurança, que deixavam as pessoas impressionadas com a sua solidez, ele só não esperava que tudo isso pudesse se tornar um pesadelo.
Certa feita, em mais uma de suas apresentações performáticas, seus olhos avistaram aqueles que seriam os olhos mais singelos e frágeis que já haviam refletido os seus, e imediatamente um desejo súbito de abraçar-lhe o invadiu sem espaço para dúvidas ou questionamentos. Nesse momento seu coração inaugurou e experimentou uma arritmia, o suor escorria, e seus braços se perdiam. Estes últimos pareciam descompostos e logo se atrapalharam, uns batiam nos outros, se enrolavam, davam nós, etc. A imagem em si era estranha, era como se os braços não se entendessem mais, e toda destreza, vigor e inteligência demonstrada ao longo de todos os shows não fizessem parte deste corpo neste momento. Os movimentos eram errôneos, e a todo o momento eles se atrapalhavam. Seria cômico todo este estardalhaço com seus membros superiores se sua feição não fosse a descrição visual do desespero e angústia.
A angústia que se denunciavam nos olhos se baseava na incoerência daquele momento, onde os seus braços e mãos, ferramentas que eram as seus cartões de visitas, nesse momento de encontro com a plenitude daquele olhar se mostravam inúteis e, além disto, se tornavam barreiras. Os olhos continuavam a se fitar afastados exclusivamente pelo paradoxo. Enquanto isso ele começava a descobrir uma forma de desembaraço frente toda aquela situação. Ele começou a se despir daquilo que era o seu show e começou a se denunciar; como conseqüência encontrou os risos... A cada riso sentia menos um braço... Faltavam muitos risos, mas parece que o objetivo já estava traçado.
2 comentários:
E vai guardar os dois ultimos risos.É o que precisa para abraçar-se àqueles olhos singelos e a partir dai, começar um novo show. Talvez, o melhor. Talvez, o de apresentação única.
Amei esse, Zé! E tantas vezes os membros físicos embarreram o contato... haja sorrisos e olhares! Que possamos multiplicá-los a cada aproximação!! :)
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